10 dicas para dar livros no natal

Se você é louco por livros, como o casal deste blog, certamente adora presentar amigos, parentes, namorado, namorada e afins com boa leitura. O natal está chegando e o Lombada Quadrada apresenta sua já tradicional lista de dicas de bons presentes literários, que em 2016 gerou um de nossos posts mais lidos.

Tudo isso em um ano difícil para o mercado editorial brasileiro. As duas maiores redes de livrarias em um crise de gestão, editoras e escritores na pindaíba com o calote gerado pelo perverso mecanismo da consignação. O quadro é grave. Mas o objeto livro, acreditamos, não é um paciente em estado terminal.

O Lombada compartilha do otimismo de Luiz Schwarcz, fundador e presidente da Companhia das Letras, que declarou seu amor ao livro e nesta entrevista à Folha de S.Paulo, na qual afirma que as livrarias continuarão a ser pontos de encontro dos leitores. Nós também acreditamos nisso. E vamos além. Será a curadoria de livros a atividade que vai sustentar as boas lojas do ramo. Livreiros atentos aos desejos de cada leitor e que sabem conversar sobre as obras, conhecem os autores, fazem indicações de leitura, abrindo conexões para seus clientes, vão fazer a diferença e sustentar esse lugar maravilhoso (e perigoso para as finanças pessoais) que é uma livraria.

A conversa está boa, mas o que te trouxe aqui foram as dicas. Então, sem mais delongas, aí vão as recomendações.

Neste ano, Renata e eu escolhemos 4 livros contemporâneos cada, com uma preferência assumida para mulheres, porque é preciso #lerlivros e é fundamental que a gente #leiamulheres. Tem romance, tem conto, tem quadrinhos, tem poesia.

E selecionamos dois autores clássicos do século XX. Um europeu e outro brasileiro.

Se quiser ampliar suas opções, as listas de presentes mais antigas continuam atuais. Confira aqui as dicas de 2015, 2016 e 2017.

Agora, é correr pra livraria, ou se for mais prático, tentar diretamente com as editoras ou pela Amazon.

Veja a lista. E deixe também suas sugestões nos comentários.


 

Angola Janga, de Marcelo D’Salete (Editora Veneta)

Angola Janga

Se alguém ainda tem dúvidas sobre a qualidade dos quadrinhos brasileiros, basta lembrar que este ano o paulista Marcelo D’Salete levou o Eisner Awards 2018 por Cumbe, melhor edição estrangeira do ano, em que ele abordava a escravização dos negros no período colonial em uma ficção fortemente ancorada em pesquisa histórica. O livro seguinte, Angola Janga, é um mergulho ainda mais profundo no tema: com um trabalho estético igualmente esmerado, a graphic novel com mais de 400 páginas se debruça sobre a complexidade do quilombo dos Palmares. Para além da evidente batalha contra bandeirantes designados a sufocar o levante os quilombolas, o livro também aborda os conflitos internos no grupo – quase um estado dentro da capitania de Pernambuco -, como o embate político entre Zumbi e Ganga Zumba. Um presentão daqueles.

 

Clarice, de Roger Mello (Global Editora)

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Este é teoricamente um livro infantojuvenil mas, na boa, eu presentearia qualquer adulto inteligente com ele, especialmente um que saiba valorizar o livro enquanto objeto. Clarice é uma esmerada produção da Global Editora, com história de Roger e projeto gráfico e ilustrações do seu sobrinho, Felipe Cavalcante. Inspirado por lembranças da infância na Brasília dos anos 1970, Clarice é um livro sobre como as crianças navegam entre não-ditos dos adultos ao seu redor, percebendo com clareza quando algo está errado e reelaborando a realidade de uma forma que possam compreender. No auge da ditadura militar no Brasil, pessoas sumiam sem explicação e livros amarrados a pedras eram atirados em lagos, o que aguçava a sensibilidade – e a criatividade – da personagem Clarice. Veja a resenha completa.

 

Maria Bonita – sexo, violência e mulheres no cangaço, de Adriana Negreiros (Companhia das Letras)

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Jornalismo histórico ou História jornalística seria uma boa forma de definir trabalhos, como de  Adriana Negreiros, que reordenam informações de pesquisas e livros anteriores a partir de um novo ponto de vista – nesse caso, o banditismo dos anos 1920 e 1930 no sertão nordestino a partir da perspectiva das mulheres que participaram desse movimento. Com texto fluido e imagético, Adriana entrega um olhar atento à forma como a história dessas mulheres foi escrita (ou escondida) até agora, numa merecida crítica aos estudos que desmereciam as queixas das meninas, raptadas ainda crianças para serem parceiras compulsórias de cangaceiros violentos. Dadá, sequestrada e estuprada por Corisco aos 12 anos, foi várias vezes acusada de exagerar esse episódio. Leia a resenha completa e nossa playlist inspirada no livro.

 

Maravilhas Banais, de Micheliny Verunschk (Editora Martelo)

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Um dos primeiros livros do ano e um dos mais queridos, Maravilhas banais é um respiro de poesia em meio a um período em que a autora se dedicou intensamente à produção de sua triologia infernal, sugerida abaixo por Carlos. O mote principal do livro é o amor sensual, tratado como um sentimento físico tão sólido quanto um osso. Além dessa corporeidade, o tema também é abordado numa sessão dedicada a uma releitura do Cântico dos cânticos (o livro bíblico), sob uma perspectiva feminista: aqui, Micheliny conclama as “mulheres de Jerusalém” a dialogar sobre a paixão. Livraço. Leia a resenha completa aqui.

 


 

Contemporâneos de Carlos

 

O peso do pássaro morto, de Aline Bei  (Editora Nós)

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Pra mim, o livro do ano. Um dos vencedores do Prêmio São Paulo de Literatura 2018, foi publicado em 2017. E nos chegou pela estratégia ousada da jovem e talentosa escritora. Ela simplesmente nos abordou via redes sociais, oferecendo o romance em venda direta. Pagamos pra ver e valeu à pena. Mandou o exemplar com uma linda dedicatória. E chapamos na leitura, cuja resenha você encontra aqui. Em linhas gerais, acompanhamos várias idades da trajetória de uma mulher, numa escrita ritmada, graficamente incrível, quase uma prosa/poesia concreta. Uma curiosidade: no debate entre autores e autoras que antecedeu a entrega do Prêmio São Paulo ficamos sabendo que a estratégia de venda direta pela autora foi muito bem sucedida. A editora informou que foram mais de 2 mil exemplares comercializados dessa forma. Fala sério, gente! Quem vende 2 mil exemplares de um romance nos tempos de hoje? Parabéns, Aline. Sorte de quem ganhar esse livro.

 

Trilogia infernal, de Micheliny Verunschk (Editora Patuá)

Trilogia 2

A trilogia infernal da pernambucana Micheliny Verunschk finalmente se completou, com o lançamento do terceiro livro. Os dois primeiros foram resenhados aqui. E, agora, o círculo em torno de Laura e do menino canibal se fecha. Uma narrativa fragmentada, com um lirismo poderoso, que é marca da autora e que te obriga a ler compulsivamente, emendando um capítulo no outro. O perigo é esquecer a hora, deixar de comer, não beber nem um gole de água enquanto não acabar toda a leitura. São três livros sobre memória, ditadura, violências de todos os gêneros. Livros que são um retrato de um país esfacelado. Mas nem por isso menos belo e intrigante. É um presente incrível, porque eles ganharam o invólucro de uma caixa. E cada edição traz projeto gráfico e ilustrações belíssimas de Leonardo Mathias e o capricho das edições de Eduardo Lacerda para a sua Patuá. Presente pra reluzir na estante.

 

O imortal, de Maurício Lyrio (Companhia das Letras)

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E se um brasileiro ganhar o Nobel? E se isso fizer parte de um plano de poder político e econômico de um país em ascensão? E se o plano for bem sucedido até certo ponto? E se houver uma mistura de humor, observações sarcásticas sobre literatura, escritores e prêmios literários? E se houver um grande desfecho, desses que nem podemos mencionar para não estragar o prazer da leitura? Pois tudo isso está na divertida leitura de O imortal, romance de Maurício Lyrio, duplo de escritor e diplomata, que traz para sua história os bastidores das relações internacionais e envolve o leitor em uma história que o presenteado vai saborear na semana de ano novo ou nas férias. A resenha você lê aqui.

 

Tudo pode ser roubado, de Giovana Madalosso (Todavia Editora)

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Moça bonita, garçonete de restaurante da moda, a personagem de Tudo pode ser roubado, romance de estreia de Giovana Madalosso, é uma sedutora esperta. Sai com clientes do restaurante, homens e mulheres, indistintamente, e aproveita para furtar de suas casas objetos de valor. Roupas, jóias, relógios. Até que recebe uma encomenda: roubar um exemplar da primeira edição de O Guarani, de José de Alencar, no apartamento de um excêntrico milionário colecionador de livros e objetos raros. Qualquer semelhança com histórias e figuras que correm por aí não terá sido mera coincidência. São, é claro, personagens ficcionais de um mundo bastante real. Leitura saborosa, com muitas camadas. Sexo, solidão, egocentrismo. Tem de tudo. E ainda a incrível, e sofrida mulher trans que dirige o brechó onde a hábil ladra desova suas mercadorias. Um romance que também é sobre São Paulo. Presente dado, satisfação garantida. Pra conferir, antes de comprar, veja aqui a resenha.

 

Clássico de Renata

O eleito, de Thomas Mann (Companhia das Letras)

O eleito

Thomas Mann é garantia de erudição e neurônios em chamas em quase tudo o que faz, tamanha a densidade que deposita em seus textos. O eleito, surpreendentemente, trilha outro caminho: quase um romance de capa e espada, é um texto ligeiro e leve – ainda erudito, só que de outra forma – sobre o mito por trás do Papa Gregório I, nos primórdios da Igreja Católica. Filho de uma relação incestuosa, a trajetória de Gregório tem pitadas quixotescas e edipianas, além de reviravoltas de fazer inveja a qualquer roteirista de novela mexicana. O narrador é um espetáculo à parte, a todo o tempo elucubrando sobre o seu papel onisciente e de guardião da “verdade”, ao mesmo tempo em que admite interferir para tornar a história mais atraente.

  

Clássico de Carlos

 Capitães da Areia, de Jorge Amado (Companhia das Letras)

Capitães

O romance de estreia de Jorge Amado é um livro de cabeceira. Li na adolescência e já o reli várias vezes. Foi com Capitães da areia que comecei o despertar para a política e a visão humanista de mundo. Além de perceber os mecanismos da imprensa a serviço dos interesses  mesquinhos e medos da classe média. Na Salvador dos anos 1930 um bando de meninos de rua, que vivem à beira mar, perambulando pela região portuária e pelas areias da praia, causam pânico e tornam-se um caso de polícia. Retrato do que ainda é a questão dos meninos e meninas que vagueiam por ruas e favelas do Brasil. No trapiche onde vivem as crianças e adolescentes, o menino Pedro Bala lidera a turma que vive de pequenos delitos. Em meio à violência e ao ódio da sociedade, eles encontram afeto, descobrem a sexualidade, mas experimentam, na maior parte do tempo, o lado mais cruel do ser humano. Leitura densa, necessária do mestre baiano. A edição da capa está na família desde 1971. Saiu pela Martins Fontes. Atualmente, a obra de Jorge Amado está na Companhia das Letras. E há uma edição de bolso, pra quem está com o orçamento curto.

 

P.S.: a foto que ilustra o post é da árvore de natal de livros da Livraria da Vila da rua Fradique Coutinho, em São Paulo. Um dos lugares que respeitam muito os livros e os leitores.

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