Não tenho pudor em escolher livros pela capa e, embora esse não seja meu modus operandi mais frequente, já me rendeu gratas surpresas. Foi por causa do design bonito que cheguei no doidaço Nova York Delirante, do holandês Rem Koolhas; e foi assim também que cheguei a Desterro: memórias em ruínas, de Luis S. Krausz.
Estava inocentemente indo almoçar no restaurante do trabalho quando o título me chamou a atenção numa prateleira distante (sim: para almoçar, eu sou OBRIGADA a cruzar uma livraria). Sendo pernambucana, Desterro fatalmente me remeteu à música de Reginaldo Rossi e à interpretação acachapante de Isaar e Comadre Fulôzinha. Fui lá conferir de perto. A contracapa estampava o logo do programa de incentivo da repartição e um resumo indicando que o curto romance, meio autobiográfico, tratava da imigração alemã em São Paulo. De uma rápida folheada, pularam diversas referências aos bairros que eu mais frequento ultimamente. Como não comprar?
Desterro é um relato amargurado de sobre uma comunidade que emigrou forçadamente e acabou se estabelecendo num não-lugar: ao não se estar mais em sua terra natal e com a tentativa de recriá-la no novo País, não há mais lar possível, qualquer parte é Drüben (“do outro lado”). A família (judia) do protagonista vem parar em São Paulo fugindo do nazismo, como milhares de outras. A vida Drüben seria impossível, mas aqui também não se desenvolve plenamente, em parte porque a comunidade se isola na tentativa de manter uma pureza cultural insustentável:
“A emigração do meu avô deveria ser temporária, até que as coisas se tranquilizassem um pouco, e um país cujo lema era Ordem e Progresso, Ordnung und Fortschritt, lhe parecia a melhor solução para aqueles tempos de caos e de retrocesso. Em São Paulo, imaginava reencontrar, intactas, aquelas virtudes cardinais habsburgas, supostamente herdadas da Imperatriz Leopoldina, a mãe habsburga do último Imperador do Brasil.”
O livro começa meio pedante, mas essa impressão fica logo para trás. No fim, Desterro trata de forma bastante lúcida da mui humana tentativa de manutenção de relações sociais que não fazem mais muito sentido fora do seu tempo e espaço originais. Esse desconforto com o tempo e espaço é também patente na forma como o autor se refere, amargamente, às mudanças que observa no ambiente urbano da São Paulo de hoje.
Enfim: uma boa pedida para os leitores aventureiros.
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