Raimundo Carrero lança Tangolomango em São Paulo nesta quarta-feira (5/6), mas não é dele que o Lombada Quadrada se ocupa hoje. Ao invés do romance mais recente, vamos aos três mais antigos de Carrero, reunidos na coletânea O delicado abismo da loucura, editado pela Iluminuras, em 2005, com belíssima capa ilustrada por gravura de Gilvan Samico (<3).
Os três livros são bem diferentes entre si, em tema e clima, mas todos os três – e tudo o mais que eu já li de Carrero, aliás – são marcados pela brutalidade. Às vezes são brutais as ações, mas são sempre e indiscutivelmente brutais as relações humanas e os pensamentos. Não fui apresentada ainda a nenhum personagem de Carrero confortável em si mesmo – e é nisso que eles são universais, não importa que geograficamente estejam sempre no Recife ou em Santo Antônio do Salgueiro.
O delicado abismo da loucura começa com A história de Bernarda Soledade. Tido como armorial, o romance é prefaciado pelo pai do movimento, Ariano Suassuna. Bernarda é a senhora de uma propriedade rural em um universo meio medievalesco e onírico. Em busca da expansão de seu império, passa por cima de tudo e todos, até de sua paixão pelo tio. Narrado em dois tempos e tenso, mui tenso, o romance me remeteu o tempo inteiro às peças de Newton Moreno, da companhia Os Fofos Encenam (#ficaadica!).
O segundo romance, As sementes do sol, trata de uma família que se despedaça a partir do suicídio da mãe. A morte da matriarca dispara uma trilha de desgraças nas relações entre o pai, o tio e os filhos. Dos três romances, é o que menos me pegou, mas ainda assim com momentos memoráveis, como o diálogo que se transforma em dois monólogos surdos entre Lourenço (o tio) e Davino (o pai).
E, finalmente, A outra face do baralho: confissões do Comissário Félix Gurgel. Das três novelas da coletânea, é a mais realista e, talvez justo por isso, a que mais incomoda pela crueza do personagem principal. Humano que dói. A tentação é dizer que este, dos três, é o romance que melhor aponta para os romances de Carrero que vieram depois (ressalta-se que li poucos, como Minha alma é irmã de Deus e O amor não tem bons sentimentos). Mas acho que mais exato seria dizer que os três estão presentes, com pesos iguais, na obra posterior do autor.
Será que é assim em Tangolomango? Tá ali, só me olhando da estante.