Ulysses me acompanhava há quase um ano. Ele foi lido no caminho do trabalho, na espera do cinema, na siesta depois do almoço, andou na minha bolsa, foi à praia, foi ao parque, viajou de avião, aguentou comigo as longas esperas por mesa no Ritz. Foi trocado por um kindle, suportou meu abandono total por duas vezes, viu vários outros livros serem lidos antes dele. Ganhou orelhas, ficou de lombada amarela com o suor das minhas mãos, capa levemente desgastada. Finalmente voltou à estante neste fim de semana, para um bem merecido descanso, longe da minha hiperidrose.
Meu Ulysses, edição baratinha da Penguin, em inglês, sem nem uma mísera nota de rodapé, suportou uma verdadeira Odisseia nas mãos desta leitora que vos tecla. Enquanto Leopold Bloom zanzava pelas ruas de Dublin num 16 de junho de 1904, meu livrão com páginas de papel jornal me acompanhou bravamente por quase oito mil quilômetros, enquanto eu o maltratava alternando horas de leitura voraz e longos períodos de esquecimento.
A odisseia de Bloom, um homem comum em um dia comum, foi como a odisseia do livro nas minhas mãos e a minha própria odisseia na travessia das quase mil páginas. Nem sempre fácil, nem sempre prazerosa, por muitas vezes eufórica, mas certamente enriquecedora.
Se eu disser que ler Ulysses é uma delícia, estaria mentindo. Mas que odisseia é feita só de delícias?