Todo ano é o mesmo dilema. O que dar para o amigo secreto da firma ou da família? E se você pegar aquele sobrinho que entrou na faculdade de filosofia? Ou a colega que concluiu doutorado em semiótica? E se for alguém que vive falando de livros, filmes islandeses, mostras de arte contemporânea? Seus problemas se acabaram! O Lombada Quadrada edita uma nova lista de presentes para o amigo secreto de fim de ano (já publicamos uma lista de presentes de Natal, que você confere aqui). São seis livros matadores. E se alguém tiver a sorte de ganhar um desses presentes, volte aqui e conte pra gente.
A amiga genial, de Elena Ferrante
A Série Napolitana, de Elena Ferrante deveria ser classificada pelo Ministério da Justiça no rol das drogas pesadas. Vicia. São quatro livros, enormes, que contam, na superfície, a história da amizade de Lenu e Lina, duas amigas que nascem em Nápoles, no fim da segunda guerra mundial. Já resenhamos o primeiro aqui. Ao dar o livro de presente, você ainda pode valorizar o produto, dizendo que ninguém sabe quem é de fato Elena Ferrante, cuja real identidade é mantida em segredo, apesar de todas as especulações. Além de uma história que te prende – e os relatos de gente que leu 400 páginas de uma tacada só, mal parando para se alimentar reforçam isso a prosa de Ferrante traz política, sexualidade, feminismo e um monte de camadas que estão por entre as aventuras e desventuras das duas amigas durante quatro décadas. Até agora, no Brasil, foram lançados pelo selo Bilioteca Azul, da Editora Globo, os três primeiros livros. O quarto, e último (não!!!!!) sai em abril. Este é um presente que você pode escalonar. Dê o primeiro volume, A amiga genial, de amigo secreto ou Natal. O outro no aniversário e assim por diante. Ou deixe o problema (e o investimento) para o presenteado. Garantimos sucesso.
Obra completa, de Murilo Rubião
Que feliz ideia da Companhia das Letras. Tirar o esquecimento o único livro publicado por Murilo Rubião, autor brasileiro que com uma produção de apenas 33 contos influenciou gente do quilate de Gabriel García Márquez, Cortázar e outras feras da literatura, tanto no Brasil quando pelo mundo. O livro, que está resenhado aqui, traz histórias de realismo mágico. Mas não com aquela poesia dos romances do colombiano Márquez. São histórias que transitam entre o absurdo e o sombrio. Além de tudo, a escrita é fluida e concisa. Alguns dos contos são pequenos, não chegam a três páginas. Mas mesmo entre os maiores, sempre há um impacto, um momento em que Rubião deixa o leitor de boca aberta. Presente para quem gosta de narrativas breves, histórias bem contadas e um toque de fantástico que puxa pro mistério.
Desesterro, de Sheyla Smanioto
Prosa e poesia se misturam no livro que deu a Sheyla o prêmio Sesc de Literatura. Publicado pela Record, em edição caprichada, o romance nos conta a história de mulheres de uma família de um sertão indefinido, que na verdade é todo o sertão. E de uma migração para uma periferia que também é qualquer periferia brasileira. As personagens, todas Marias, mãe, filhas, netas, vivem em um mundo que lhes é hostil, como sempre é para a imensa maioria das mulheres. Violência, abuso sexual, incontáveis horas de trabalho para pouco ganho. A realidade crua é contada com uma linguagem requintada. Capítulos curtos, muita poesia, palavras montadas, como o próprio Desesterro do título, fazem do romance de Sheyla Smanioto uma das dicas de presente mais refinadas desta lista. E ao mesmo tempo, a mais popular e dramática pelo modo como conhecemos as histórias de Penha, Fátima, Cida e Sclarlett, as marias. Histórias que se confudem, personagens que parecem muitas. O livro já está resenhado por Renata, aqui no Lombada.
O inferno dos outros, de David Grossman
Um artista da stand up comedy, em plena decadência, liga para um conhecido de infância, com quem mal conviveu na escola, e o convida para um show em uma casa obscura na cidade de Haifa. O narrador, juiz de direito notório, já aposentado, aceita o insólito convite. E vai ao show. Deslocado, porque detesta shows de humor, ele acaba entrando no fio da meada das histórias do comediante, que começa a enxertar um episódio do passado entre as piadas sexistas, carregadas de preconceitos contra palestinos e, claro, com o pior do humor judaico, em historietas toscas e batidas. A plateia urra, vaia, ri, se emociona e se irrita. Em uma narrativa alucinante, vamos conhecendo como o comediante perdeu seus pais. E como esse pode ter sido um evento no qual o futuro juiz de direito simplesmente não deu atenção ao colega de escola. Um romance sobre os outros. Sobre a surdez cotidiana em um mundo permeado por relacionamentos cada vez mais intensos, nas redes sociais, e cada vez mais superficiais também. O livro, publicado pela Companhia das Letras, foi resenhado aqui.
Raduan Nassar, a escolher
O escritor paulista Raduan Nassar publicou nos ano 70 três livros. O romance Lavoura arcaica e dois livros que podem ser definidos como uma novela curta chamado Um copo de cólera e um livro de contos, que é Menina a caminho. Depois disso, parou de escrever e foi cuidar de uma fazenda no interior de São Paulo. Neste ano, ganhou o importante Prêmio Camões e andou dizendo que voltará a escrever. Abandonará a literatura do não, que segundo a definição de Enrique Vila-Matas, é composta por aqueles que publicaram apenas um livro ou que interromperam sua produção e jamais voltaram a escrever. Mas estou aqui para falar de Nassar. E recomendo os três ou cada um deles como presente. Em Lavoura, que já virou filme, as tensões de uma família patriarcal em uma fazenda são narradas com uma intensidade arrebatadora. Em Um copo de cólera, um casal, também em um ambiente rural, começa a discutir a relação. Esse livro também virou filme, com atores globais e tudo. A DR é profissa. De um problema com uma roseira e algumas formigas, a discussão vai ao fundo do fundo do fundo da relação do casal. É de tirar o fôlego. E o que dizer do lindos textos de Menina a caminho, a começar pelo que leva o nome do livro, uma singela e bonita história de uma garota que sai de sua casa e vai caminhando pelo centro de uma pequena cidade. Os contos são marcados por uma delicadeza que não se encontra nos outros livros de Raduan Nassar. Aproveite que a Companhia das Letras relançou os três livros, que têm um bom preço, outra coisa muito boa na hora de um amigo secreto.
A capital da solidão, de Renato Pompeu de Toledo
Se seu amigo secreto gosta de fatos históricos bem contados está é uma dica e tanto. O relato dos primeiros 350 anos da história da cidade de São Paulo, feito pelo jornalista Roberto Pompeu de Toledo, não tem pretensões historiográficas, embora o rigor da pesquisa não fique a dever para bons estudos acadêmicos. O grande feito dessa “biografia” da maior cidade brasileira em seus primórdios é mostrar que ao longo de mais de 300 anos São Paulo foi um lugar solitário, bugre, um povoado de ogros que foram abrindo as fronteiras do Brasil a machadadas, tiros de bacamarte, chicotadas e muita brutalidade. Ao final da leitura, com ótima pesquisa iconográfica, você tem a certeza de que muito do que São Paulo é hoje começou lá no século XVI, com ocupação indevida de espaço que deveria ser público entre tantos outros defeitos da futura metrópole. Além de tudo, o livro publicado pela editora Objetiva é divertido e carregado de fofocas, histórias de alcova e, porque não, de personagens dos quais os paulistas até podem se orgulhar. Veja a resenha do Lombada aqui.
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A amiga genial, de Elena Ferrante
Obra completa, de Murilo Rubião
Desesterro, de Sheyla Smanioto
O inferno dos outros, David Grossman
Raduan Nassar
A capital da solidão, Roberto Pompeu de Toledo
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Olá,
Concordo com todos com exceção da Elena Ferrante. Diante da sua resenha e me desfazendo do meu pré-conceito , comprei e comecei a ler.
Fui lendo e lembrando mais uma vez dos seus comentários, insisti………..mas confesso que achei muito chato, lugar comum, narrativa, tema e diálogos bobos e desisti.
Uma frustração parar um livro mas acontece.
bjs e um grande natal e 2017.
Bia
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Não há como discutir o gosto pessoal e a empatia com o livro. Mas demorei a embarcar em Elena Ferrante. E o primeiro livro realmente demora a encaixar. Eu diria que o encantamento aparece no fim. E te leva rapidamente ao segundo livro. No último sábado estive em debate do #leiamulheres sobre o terceiro livro. Uma legião de pessoas encantadas pela prosa que está longe de ser superficial.
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