Então 2015 acabou – e já foi tarde. Será para sempre lembrado como o ano em que a Cosac Naify anunciou seu fechamento e em que o Museu da Língua Portuguesa foi destruído por um incêndio. Dois acontecimentos assim logo no final do ano têm o potencial de jogar para o esquecimento qualquer lembrança positiva antes deles, mas tentemos: foi também o ano da Primavera das Mulheres e em que, coincidência ou não, as escritoras lideraram os grandes prêmios literários em língua portuguesa.
No plano pessoal, não posso reclamar: me coloquei a meta de ler 52 livros no ano, um por semana, e terminei com 56 volumes lidos – mais de 12 mil páginas no total. O Goodreads foi ponta firme na contagem e me ajudou a manter o ritmo ao longo do ano, além de registrar por data todas as leituras.
Não posso apontar a mesma constância quanto à proposta inicial do Desafio dos 52 livros de 2015: percorrer minhas estantes por ordem alfabética do sobrenome do autor, um estrangeiro, um brasileiro, uma não-ficção e o quarto livro de escolha livre. Acontece que em outubro começaram a sair os finalistas dos prêmios literários e isso sempre me deixa coçando para voltar à literatura contemporânea – de lá até dezembro, li basicamente brasileiros publicados em 2014.
No meio do caminho também teve o #leiamulheres e a consciência de que tinha escritoras de menos na minha biblioteca. Em certo ponto, a escolha dos títulos também foi guiada pela necessidade/curiosidade de dar mais atenção a elas, especialmente em um ano no qual a luta feminista ganhou tanta atenção.
É isso, inclusive, que guiará meu Desafio 2016: permanecem os 52 livros, mas me estabeleci o compromisso pessoal de ler uma escritora para cada escritor, alternadamente. Até o fim do ano, espero ter conhecido muita coisa boa produzida por mulheres, a quem a indústria editorial dá menos atenção, menos visibilidade e menos chances de chegar às nossas estantes.
A lista completa dos livros lidos em 2015 você encontra no Reading Challenge do Goodreads, mas quero destacar alguns. Antes disso, no entanto, preciso agradecer muito pela audiência do Lombada Quadrada: retomamos o blog em agosto e fechamos 2015 com mais de 30 mil page views. Vocês são demais! 😀
E vamos aos melhores de 2015 segundo o Data Renata:
É Tudo Verdade
A melhor não ficção do meu ano foi Musa Praguejadora, de Ana Miranda (Record). A biografia do poeta barroco Gregório de Matos é um trabalho único de pesquisa histórica e de interpretação literária, tudo junto em um mesmo volume. Sobre este livro, escrevi uma longa resenha para o Suplemento Pernambuco, reproduzida aqui no blog.
É Tudo Verdade – Menção Honrosa
Olhando agora a minha lista vi que meu ano foi coalhado de excelentes livros de não ficção. Teve Apresentação da poesia brasileira, de Manuel Bandeira; A noite da arma, de David Carr; teve Retratos parisienses, de Rubem Braga. Mas a menção honrosa vai mesmo é para O nascimento de Joicy, de Fabiana Moraes (Arquipélago). O livro é uma extensão da reportagem publicada pelo Jornal do Commercio sobre um lavrador no interior de Pernambuco em sua saga para mudar de sexo pelo SUS. Fabiana faz uma incrível análise do jornalismo contemporâneo enquanto defende uma prática jornalística mais humanizada. Sensacional.
Prêmio Los Gringos de Literatura Estrangeira
É até sacanagem chamar de gringo, já que o prêmio vai para José Eduardo Agualusa, por sua Teoria Geral do Esquecimento (Editora Foz). Numa Luanda em guerra civil, a narrativa acompanha personagens arquetípicos da história contemporânea do País de maneira incrivelmente poética e ao mesmo tempo política. Tudo acontece em torno de Ludo, portuguesa que se empareda em seu próprio apartamento numa vã tentativa de se isolar da confusão lá fora. Agualusa também protagonizou o melhor momento do ano em festas literárias, incluindo citação a Pernambuco – relembre aqui.
Um clássico é um clássico é um clássico
Eu poderia citar Teatro de Machado de Assis, mas a verdade é que a leitura há mais de um ano não me ajuda muito na hora de resumi-lo aqui. Por isso, vou ficar com Antígona, de Sófocles, como o grande clássico do meu 2015. Cheguei nessa peça grega por causa de O pior dia da minha vida foram todos, livro incrível de Evandro Affonso Ferreira, que a usa como mote. Antígona, uma das filhas de Édipo, se rebela contra o rei de Tebas para poder enterrar seu irmão, morto lutando pelo exército inimigo. Enquanto o corpo apodrece ao ar livre, acompanhamos reflexões sobre autoritarismo, poder, consciência e o papel da mulher na sociedade de então. Leitura riquíssima.
Prêmio dos Prêmios
Dos vários ganhadores e finalistas de prêmios literários de 2015, o livro mais instigante foi Nossa Teresa: vida e morte de uma santa suicida, da minha conterrânea Micheliny Verunschk (Patuá). Li em dezembro e ainda estou digerindo direito, mas posso garantir que foi uma das melhores experiências literárias do ano. Micheliny recebeu o Prêmio São Paulo de Literatura na categoria Autor Estreante – Mais de 40 anos. Poeta, foi seu primeiro romance. Me deixou bem curiosa pela sua poesia, aliás.
Grande Prêmio Surpreendeu Renata de Literatura
Este vai para Negras Raízes, de Alex Haley (Record). Foi de longe a leitura que mais me causou impacto este ano. A saga de uma família afro-americana desde o seu primeiro ancestral trazido como escravo da África é emocionante, diria até que leitura obrigatória. Sobre ele, escrevi uma das resenhas mais acessadas do Lombada Quadrada em 2015 – veja aqui.
É isso, galera. Espero que fiquem com a gente em 2016.
PS: O título deste post é descaradamente roubado da mostra realizada todo fim de ano pelo Cinema da Fundação no Recife, em que são exibidos os melhores do ano que passou e as apostas para o ano seguinte. Uma das minhas grandes saudades na capital pernambucana.